Upstream Color e o Cinema Autoral

sábado, 25 de outubro de 2014

Assistir Upstream Color, filme mais recente do diretor Shane Carruth, foi uma experiência única, em todos os sentidos. Upstream Color é um desses filmes mais autorais, ou seja, ele destaca o diretor como força criativa do filme, ignorando as exigências dos grandes mercados. Isso quer dizer que se o diretor quiser pegar toda a mensagem que ele quer passar, jogar tudo num "liquidificador", e for filmar na ordem em que as coisas forem saindo, ele vai poder fazer sem os executivos o podando a todo momento para tornar o filme de fácil compreensão. Não estou dizendo isso porque o filme foi feito dessa forma, muito pelo contrário, Carruth claramente sabia o que estava fazendo. Estou dizendo isso porque o filme é extremamente complexo pra pessoas que não estão acostumadas com esse tipo de obra. Pessoas como eu.

          Escrever uma sinopse pra esse filme é até mais difícil do que compreendê-lo. Devo admitir que, a princípio, como a maioria dos "leigos" que o assistem, não consegui entender nada. O filme ia cortando de uma cena pra outra, e eu vislumbrava uma trama começando a se formar, mas sempre que eu achava que ia entender finalmente tudo, eu terminava ainda mais confuso. Depois de ler vários comentários a respeito na rede social Filmow, vi que era essa a primeira impressão que o filme causava nas pessoas. Porém, algo que parecia ser constante também era que todos se sentiam atraídos pelo filme. Por mais confuso que fosse, não vi praticamente ninguém falando que largou o filme na metade. Pelo contrário, todos queriam entender o que o filme estava querendo passar, e ele te prende muito bem. Depois dos primeiros 30 minutos, não conseguia mais tirar os olhos da televisão.
                Kris(Amy Seimetz), a protagonista, é raptada e um verme é introduzido em seu organismo. O resultado é a hipnose profunda e total submissão a seu captor. Ele diz que ela não pode olhar diretamente para ele pois a cabeça dele é feita do mesmo material do que o sol e ela acredita. Ele diz para ela vender a casa e dar o dinheiro pra ele e ela faz. Um tempo depois, o captor some. Ela é então atraída para um homem que "a cura". A partir daí, Kris tenta seguir sua vida, e então Jeff aparece em sua vida. Jeff é interpretado por Shane Carruth e tudo que indica que seu personagem também passou por algo como Kris. Eles se juntam para tentar talvez buscar respostas sobre o que lhes aconteceu. Daí em diante, "o que nos resta são interpretações".
            Não vou mentir pra vocês: eu terminei o filme sem entender absolutamente nada. Mas não me julguem, este foi o meu primeiro contato com esse tipo de filme. E isso foi ótimo, porque ele serviu pra expandir o meu horizonte. Eu já me considerava um cinéfilo, e curto muito filmes mais "cabeça". Porém, estamos todos acostumados com filmes que vem mastigados pra gente. Mesmo aqueles como Matrix, que rendem longas horas de debates após assistidos, tem uma mensagem muito clara. Mesmo que algumas pessoas peguem referências que outras não pegaram, esses filmes conseguem nos passar a história de uma forma um tanto quanto clara. Isso não acontece em Upstream Color, e acredito que seja assim no cinema mais autoral, e talvez por isso seja um gênero tão de nicho.
            Infelizmente, o defeito do filme é ele possuir essa narrativa demasiadamente complexa e extremamente difícil de acompanhar. Acredito que há outras formas de contar a mesma história, de passar a mesma mensagem, mas de uma forma um pouco mais linear, sem nem por isso deixar o filme óbvio demais. Não é porque o filme é mais linear que ele perde seu valor ou complexidade, veja, por exemplo, Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças.
            Enfim, ninguém é obrigado a gostar desse tipo de filme. Mas é extremamente interessante ver como cada pessoa o interpreta de uma forma, ou como tem pessoas que simplesmente não vem sentido nenhum nesse tipo de obra. A minha dica? Assista o filme, e depois vá escutar o debate feito no podcast Zoom Cast. o programa dos caras me fez ver facetas do filme que eu não esperava, e suas opiniões me fizeram enxergar o tamanho do valor desse filme. A discussão é muito interessante, e em vários momentos quis estar ali no meio. Espero que da próxima vez que pegue pra assistir um filme desses eu já consiga sozinho ir criando minhas próprias interpretações.
            Ah, vale ressaltar que a fotografia e trilha sonora do filme são ótimas, cheias de sentimento. O filme me deixou nostálgico e melancólico em diversas passagens, apenas pelo belo trabalho da direção de som e fotografia.

Entrelinhas

            Achei engraçado o livro estar recheado de referências ao livro Walden, do autor Henry-David Thoreau. Coincidentemente minha mãe está lendo esse livro no momento. O filme parece ter fortes ligações com o livro e com as teses do autor do mesmo. Se alguém souber mais a respeito, comente aqui!

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