Quando
alguém nos recomenda a assistir a recente minisérie documental do Netflix, Wild
Wild Country, normalmente essa pessoa associa a série a vida de Osho, um dos
líderes espirituais mais famosos do século XX. Porém, Wild Wild Country não é
sobre Osho. Também não é sobre seus discípulos ou sobre a sua filosofia, por
mais que estes sejam importantes atores desta história. Wild Wild Country é a
história de Rajneeshpuram, o maior experimento da obra de Osho.
AFINAL, DO QUE SE TRATA A MINISSÉRIE WILD WILD COUNTRY E O QUE FOI RAJNEESHPURAM?
Nos
anos 70, um guru indiano começava a chamar atenção em seu país, recebendo até
100.000 pessoas por ano em seu resort de meditação na cidade de Puna. Em Puna,
Osho, na época chamado de Bhagwan Shree Rajneesh, aplicava métodos terapêuticos
em workshops e dava palestras diariamente, pregando a busca da liberdade
através da meditação e atacando as religiões tradicionais, atraindo cada vez
mais ocidentais atraídos por suas ideias de renunciar às repressões impostas
por religiões, educação, governos e outras tradições, sem ter de abrir mão do
mundo material. Mas Wild Wild Country não vai contar essa história. Então vamos
um pouco além.
Link do Vídeo no Youtube: Wild Wild Country | Trailer (Sem Legendas)
PORQUE WILD WILD COUNTRY VALE O SEU TEMPO?
Wild
Wild Country já valeria o seu tempo apenas por lhe contar essa bizarra e
fascinante história que poucas pessoas conhecem. Mas o documentário vai muito
além de meramente narrar os fatos. Os produtores foram muito hábeis em contar
todos os lados da história, entrevistando diversas pessoas que estavam
envolvidas na confusão, e auxiliados por uma excelente trilha sonora, tornam a
experiência de maratonar esta série extremamente imersiva. Com isso, as vezes
nos identificamos com os sannyasins, nos revoltando com o conservadorismo e
xenofobia daqueles vizinhos americanos – eu até entenderia se o que os
incomodasse fosse o fato de que, da noite pro dia, uma cidade de 50 habitantes
fora tomada por uma horda de pessoas, alterando suas rotinas e seus costumes
pacatos. Mas infelizmente, seus depoimentos nunca vão por este caminho. Ao
invés disso, preferem sempre atacar os hábitos, as crenças e o comportamento
“depravado” de seus novos vizinhos –, mas as vezes nos assustamos também com os
rumos da comunidade Rajneesh, e com o fanatismo e a ganância de alguns dos
envolvidos. Aos entrevistados é dada a oportunidade de se revelarem como são,
com suas virtudes e defeitos, e no final, acabamos compreendendo e até mesmo
concordando com seus pontos de vista. Até mesmo os de Sheela, secretária e
porta-voz de Bhagwan, que foi capaz de tantas atrocidades supostamente em nome
do guru. Sheela, acusada pelas autoridades americanas de ser uma pessoa
desprovida de empatia, hoje trabalha cuidando de idosos com problemas de saúde,
para que não terminem suas vidas sozinhos, tentando continuar praticando os
ensinamentos de Osho. Ou seja, o documentário tenta fugir do maniqueísmo
clássico, mostrando que há escuridão em todos nós.
Bom,
particulamente o documentário me deixou mais indignado ainda com as
instituições americanas, que pregam a liberdade de expressão mas que fazem de
tudo, inclusive dobrar as suas próprias legislações, para “pegar” alguém que
faça algo que eles não “gostem”. Por mais inescrupulosos que sejam os feitos de
Sheela, ao estufarem o peito para julgar seus atos, feitos sob a justificativa
de proteger uma comunidade ameaçada, os EUA escancaram a hipocrisia de suas
próprias instituições, que a condenam pregando uma falsa moralidade, quando
eles mesmos fazem as mesmas coisas em guerras mundo afora, quando sentem que a
integridade e a segurança de seus país está ameaçada. E não foi isso que os sannyasins
fizeram, vendendo a alma quando sentiram que sua comunidade estava sob ataque?
Sheela e EUA são mais parecidos do que ambos gostariam de admitir.
MAS AFINAL, O QUE WILD
WILD COUNTRY NOS DIZ A RESPEITO DE OSHO?
Dito
tudo isso, é importante destacar outro ponto. Eu, particularmente, sempre
gostei muito dos ensinamentos de Osho, e por isso, terminei o documentário
dividido e cheio de perguntas. Afinal, então ele foi mesmo um charlatão, ou ele
realmente não sabia dos crimes praticados por sua secretária? E até onde isso
pode desvalorizar seus ensinamentos, os quais tanto me identifico? Mas não
teremos respostas, ao menos não neste temporada. Como já frisei algumas vezes,
o documentário é sobre a história da cidade e do conflito político e ideológico
dos administradores de Rajneeshpuram com os moradores das cidades vizinhas no
Oregon e, por isso, ele não se preocupa muito em destrinchar aspectos da vida
de Osho, ir a fundo para entender até onde ele estava envolvido ou era alheio a
tudo o que acontecia, e muito menos a verdadeira motivação por trás de cada um
dos envolvidos. Além disso, apesar da enorme quantidade de registros e depoimentos,
pouco é falado sobre a filosofia de Bhagwan: afinal, o que se praticava em seus
centros de meditação? Quais eram seus ensinamentos e como ele conseguia atrair
tantos seguidores devotos? Muitos dos comentários feitos durante a exibição
falam dos frequentes sexos grupais e da completa falta de “pudor” dos sannyasins,
mas segundo seus discípulos, o guru queria apenas que o sexo n ão fosse
renegado, e que os boatos de orgias na comunidade vinham de quem queria se
aproveitar da liberdade sexual para “aprontar”.
O VEREDICTO
Enfim,
Wild Wild Country é uma série documental inteligente, informativa e surpreendente, que se esforça para ser
imparcial. Defitivamente, trata-se de uma história que a maior parte das
pessoas não acreditaria ser real, caso alguém contasse. Impressiona também a
riqueza da parte documental. São muitos registros da época, sendo algo
impressionante de se assistir. Porém, mesmo contando de maneira maestral a
trajetória de Rajneeshpuram, a série não explora a fundo alguns aspectos-chave
da questão, deixando várias questões em aberto e muitas dúvidas na cabeça dos
espectadores, soando em alguns momentos, sim, parcial, por ocultar informações
importantes – faltou contextualizar algumas coisas exibidas na minisséria, como
os trechos do filme “Ashram in Poona”, e até mesmo embasar algumas das
acusações feitas. Portanto, apesar de um excelente relato da história da
comunidade de Rajneeshpuram, o documentário não responde a muitas perguntas, e
não desenvolve muitos dos fatos que apresenta aqui e ali ao longo dos 6
episódios. Além disso, falta explicar um
pouco da beleza e da profundidade dos ensinamentos de Osho, e do porquê das pessoas
fazerem tanta questão de estarem perto do guru. Mas, vale muito a pena você dar
uma conferida, pois é uma história surreal e ao mesmo tempo fascinamente, que
explora não apenas o experimento de Osho, mas o aspecto humano das pessoas
envolvidas. Eu, particularmente, terminei de assistir o último episódio muito
emocionado, e emocionalmente conectado a Osho e todas aquelas pessoas que eu
nunca vi na minha vida.
E até hoje me pergunto como a gente
não sabia desse escândalo todo em Rajneeshpuram? Também não sei.
Terminei
a maratona louco pra ler mais material sobre esses eventos, procurando por
fontes de diferentes lados da história, e biografias de todos os envolvidos.
Recomendo que façam o mesmo. Pra quem terminou a série com todas essas dúvidas
também, vale ficar por dentro das novidades do novo livro de Philip Toelkes,
advogado de Osho, que promete contar com mais detalhes todos os eventos
narrados em Wild Wild Country. E recomendo um vídeo que ajuda a
complementar um pouco da experiência da série:
Entrevista concedida por Sheela no Primera Persona Festival, no Centre de Cultura Contemporània de Barcelona, em maio de 2018 (infelizmente, o vídeo está em inglês e não possui legendas)
APROFUNDANDO A DISCUSSÃO
Caso você já tenha assistido à Wild Wild Country e queira se aprofundar na discussão comigo, deixa aí seu comentário. Aproveita, e diz também se gostou deste novo formato. Estou tentando escrever críticas e resenhas mais objetivas e didáticas, que te ajudem mesmo na hora escolher o que vale ou não a pena o seu tempo e dinheiro.
"O que define um filme ser bom ou não? O que define você gostar ou não de alguma coisa? Seus gostos? Sua subjetividade cunhada pela sua vivência e experiências sociais desde a sua infância até o momento atual no sentido mais existencialista possível dessa lógica? Apenas você. E mais ninguém define o que é bom ou não. O que um crítico de cinema faz é discutir se regras usadas, pra facilitar uma mensagem passada de modo áudio visual, foram bem sucedidas. Analisa essas regrinhas que facilitam a captura da atenção do interlocutor. Analisa se além dessas regras o diretor se arriscou em botar ali, algo seu de um jeito especial. De um jeito até pra poucos. E essa é (às vezes) a graça de um filme blockbuster ou cult. E se mesmo sem usar essas regrinhas o diretor e sua equipe conseguiram passar a mensagem, conseguiram te atingir, conseguiram capturar a atenção de sua subjetividade cunhada pela sua vivência e experiências sociais desde a sua infância até o momento atual no sentido mais existencialista possível dessa lógica? E se mesmo assim eles conseguiram… O filme ainda é ruim? O filme não funciona? Bem, se sua resposta é sim, que não funciona, é uma pena você pensar tão pequeno sobre cinema ainda. Se sua resposta é não, ele funciona e que regras pra facilitar são apenas regras pra facilitar e que não, necessariamente, são uma obrigação. Afinal… Você considera cinema uma arte, não é? E existem regras pra arte?"
(Alcênio Borges, ZOOMNews)
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